As Sociedades de profissionais e a transparência fiscal

“Decorridos 25 anos após a sua introdução, com o Código do IRC, o regime de transparência fiscal encontra-se em revisão, inserida no âmbito da reforma alargada do Código do IRC, que o Governo apresentou no passado dia 15 de outubro.
O regime de transparência fiscal caracteriza-se, essencialmente, pela imputação aos sócios da sociedade transparente da respetiva matéria coletável, ainda que não tenha havido distribuição de lucros.

Ou seja, embora a matéria coletável da sociedade transparente seja determinada em sede de IRC, a obrigação do pagamento do imposto ocorre na esfera dos respetivos sócios, integrando-se os valores imputados, no caso de sócios pessoas singulares, como rendimentos do trabalho independente para efeitos de IRS.

O regime de transparência fiscal aplica-se, obrigatoriamente, às sociedades com sede ou direção efetiva em Portugal, que se encontram identificadas no artigo 6.º (1) do Código do IRC, entre as mesmas se encontrando as «sociedades de profissionais».

As «sociedades de profissionais» são sociedades constituídas para o exercício de uma atividade profissional (constante da lista prevista no artigo 151.º do Código do IRS), nas quais todos os sócios são pessoas singulares e profissionais dessa atividade. Em geral, estão aqui compreendidas as denominadas profissões liberais (atividades independentes de caráter científico, literário, artístico, educativo ou pedagógico, bem como as atividades independentes de médicos, advogados, engenheiros, arquitetos, dentistas ou contabilistas).

A proposta de lei que procede à reforma do Código do IRC propõe uma nova definição de «sociedades de profissionais», mais completa, que deixa de se reconduzir, obrigatoriamente, à referida exigência de identidade da profissão dos sócios.

Assim, passa também a qualificar como «sociedades de profissionais» aquela cujos rendimentos provenham, em mais de 75%, do exercício conjunto ou isolado de atividades profissionais especificamente previstas na lista constante do artigo 151.º do Código do IRS, desde que, cumulativamente, em qualquer dia do período de tributação: (i) o capital social pertença a um número de sócios não superior a cinco; (ii) nenhum dos sócios seja pessoa coletiva de direito público; e (iii) pelo menos 75% do capital social seja detido por profissionais que exercem as referidas atividades, total ou parcialmente, através da sociedade.

Com base nesta definição alargada de «sociedades de profissionais» proposta para 2014, teremos, então, a partir dessa altura, sociedades que atualmente não configuram como «sociedades de profissionais», para efeitos do regime de transparência fiscal, por exemplo, porque um dos sócios não é profissional da atividade, ou porque a sociedade exerce mais do que uma atividade profissional, e que passarão a estar vinculadas a este regime, com as consequências daí advenientes, na esfera dos seus sócios.

Ora, considerando que a atual tributação em sede de IRS (inalterada para 2014) se encontra em níveis estratosféricos (pode, por exemplo, ir até 53%), por contraponto com a tributação em sede de IRC, a qual, aliás, será reduzida para 2014, facilmente se retira que a passagem para o regime de transparência fiscal poderá implicar, para muitos profissionais liberais, um adicional esforço fiscal.

Nesse âmbito, ganha especial atualidade a sugestão, defendida por algumas correntes, quanto a tornar a transparência fiscal num regime optativo. Trata-se, no fundo, de uma opção de maior simplificação e justiça relativa porquanto mitiga a diferença de carga fiscal, entre IRS e IRC, para os mesmos escalões de rendimentos. O que, no atual panorama fiscal português, não deixa de ser relevante.

* Sousa Guedes, Oliveira Couto & Associados, RL

@ https://www.jornaldenegocios.pt/opiniao/detalhe/as_sociedades_de_profissionais_e_a_transparencia_fiscal.html

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